Liubliana
Em Liubliana ele disse-lhe que a amava. Dois meses
antes, em Paris, classificou-a de burguesa estúpida. Em Dubrovnik levou-a a
passear de teleférico para lhe dizer que ela era genial e que se sentia nas nuvens,tão apaixonado
e contente que poderia voar.
– Então porque não voas? – replicou ela.
Ele disse-lhe que poderia fazê-lo, que a amava e, mais
tarde, que ela era uma cabra, como aquelas que por ali andavam a pastar. Esbugalhando
os olhos, assumindo um ar demente, comparou-se a um dragão viril, como aqueles na
ponte de Liubliana, como o velho Vlad o empalador, Drácula de cognome. Ela,
incomodada com o seu hálito mais do que com as suas façanhas, repetiu a
pergunta, acrescentando:
– Então porque não voas? E me
deixas em paz?
Dubrovnik
– Não percebes que tudo isso
são metáforas, minha jóia?! Se eu saísse a voar – disse ele –, rebentava os cornos
contra o chão, ali ao pé daquelas cabras! É isso que tu queres?
Dias depois, junto à muralha
de Kotor, no Montenegro, jurou que, por ela, viveria ali como um sem-abrigo, ou
em Tombuctu como um cristão-novo, ou mesmo no Nepal como um hindu convertido ao
budismo. Achava-se imbuído de uma infinita sensação de paz.
– Com tanta elevação, poderias
voar até lá acima, até ao topo daquelas montanhas – sugeriu ela e apontou a
cadeia montanhosa que se elevava mesmo às costas da cidade. E logo acrescentou:
– Claro que isto é apenas uma metáfora!...
Kotor
Em nenhuma das cidades que
visitara ela se sentira uma estrangeira. De um modo que lhe parecia natural, em
todas essas urbes, maiores e menores e com línguas mais ou menos agrestes, ela
se destrangeirara rapidamente. Em contrapartida, aquele homem que já fora belo,
português como ela, era cada vez mais um estranho, um palerma
convencido com trejeitos de bipolar, que passara das pilhérias juvenis aos
insultos de um bêbado e que se tornava a cada semana, a cada viagem, a cada
refeição, mais insuportável.
[Fotografias (c) Luís Diferr]
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